A negligência médica e a responsabilidade do profissional de saúde

A “negligência médica” é, indubitavelmente, um tema de relevo comunitário, uma vez que cada um de nós, quer por razões de segurança e saúde pública, quer inclusivamente pela necessidade que cada pessoa tem em recorrer, ou que poderá vir a recorrer, a determinados cuidados e atos médicos.

Hoje em dia, tendo em conta a rápida difusão das notícias e informações através de meios televisivos, internet e redes sociais, emerge um alarme social quanto a tal temática, bem assim um julgamento precipitado no que concerne à notícia e informação difundida.

Contudo, importa referir que nem todas as situações são configuráveis e enquadráveis no conceito da negligência médica, existindo também a figura do erro médico, que, comummente são confundidas, mas objetivamente são figuras bem diferentes e que comportam soluções jurídicas diametralmente distintas.

Assim, entende-se por “negligência médica” todas aquelas ações / omissões dos profissionais de saúde que provocam um dano ao paciente, sem que o médico proceda com o cuidado e o respeito às boas práticas a que está adstrito, como por exemplo, não realizar uma radiografia de forma correta, não realizar uma TAC antes dos sintomas graves, atrasar uma operação mais do que seria prudente.

Por “erro médico” entende-se todas as ações do profissional de saúde que causam efeitos lesivos ao paciente decorrente da utilização indevida dos cuidados prestados, ou mesmo de um diagnóstico e terapêutica desadequados, como por exemplo administrar um fármaco em quantidade superior à devida e necessária ao paciente.

A negligência e erro médico podem agrupar-se, grosso modo, em duas grandes categorias:

– erros/atrasos no diagnóstico; e,

– erros/atrasos no tratamento.

As consequências da negligência e erro médico podem ser a morte, o provocar de lesões e/ou o prolongamento do tempo de recuperação ou de convalescença, prolongamento das dores, entre outros.

Para além disso, todo paciente que seja alvo e vítima de um ato de negligência e erro médico, supõe um sofrimento adicional que é precisamente o que se define como danos morais (um dano não patrimonial, pessoal e de carácter subjetivo), sendo que este dano pode ser sofrido pelo paciente ou por familiar da vítima (em caso de morte ou efeitos graves irreversíveis).

Assim, estando nós, em abstrato, perante um ato de negligência ou erro médico é necessário provar a culpa do respetivo profissional de saúde.

Ora, a culpa exprime-se através de um juízo de reprovabilidade pessoal da conduta do agente que, em face das circunstâncias concretas do caso, podia e devia ter agido de modo a evitar o facto ilícito, nomeadamente:

  • Saber se o diagnóstico realizado pelo profissional de saúde foi baseado na Medicina da Evidência e o respeito pelos protocolos assumidos pela Unidade de Saúde (Joint Commission Internacional – JCI);
  • Perceber se o profissional de saúde atuou de acordo com as melhores práticas médicas – legis artis;
  • Se o profissional de saúde respeitou os mais recentes e atuais ensinamentos da medicina moderna;
  • Se o profissional de saúde atuou com zelo, diligência e o dever de cuidado que sobre a sua profissão impende.

Assim, existindo um dano no paciente lesado a Administração de Saúde, o Hospital, a Clínica, o profissional de saúde ou a seguradora devem indemnizá-lo.

É ainda importante salientar que provando-se que um determinado profissional de saúde praticou um ato qualificado como de negligência ou erro médico existem circunstâncias atenuantes da sua responsabilidade, por forma a minorar a sua culpa, como por exemplo, a sobrecarga de meios, a sobrecarga horária e o subfinanciamento de meios.

Por fim, ressalve-se que nem todos os atos médicos que provoquem uma lesão num paciente, são suscetíveis de configurar um ato de negligência ou de erro médico, uma vez que podem existir causas relacionadas com a evolução do quadro clínico que obstam à responsabilização do profissional de saúde.

Na verdade, e conforme se sabe, a obrigação de prestação de serviços médicos assume uma natureza de prestação de meios (empregar todos os esforços ao seu alcance a favor do paciente), como seja, minorar a dor, proporcionar bem-estar, saúde, alívio e até salvar vida, se o paciente se encontrar em perigo de vida.

A prestação de serviços médicos não se trata de uma obrigação de resultado – de assegurar a todo o custo a cura -, mas a de prestar os seus serviços, incluindo cuidados e conselhos, esclarecimentos dos riscos usuais e comuns em certos tratamentos, mas não já produzir um resultado esperado, porque na prestação de serviço podem interferir variáveis absolutamente incontroláveis e imprevisíveis (como o paciente não seguir as recomendações do médico), mesmo que empregue toda a diligência.

Assim, conforme é entendimento pacífico na nossa jurisprudência, o médico cumpre satisfatoriamente a sua prestação se utilizar as técnicas e meios aceitáveis e adequados, com recurso às regras da arte clínica recomendadas, ainda que o resultado obtido seja inferior ao expectado.

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