No final de Maio, mês típico de celebração do trabalhador, Trabalho e das condições do mesmo, foi lançada a agenda do trabalho digno e de valorização dos jovens no mercado de trabalho.
Nesta agenda, percebemos que o governo está em princípios de iniciar uma megaoperação de reestruturação do código do trabalho, assente em 15 pilares e 70 novas medidas. Uma reestruturação inédita no que à legislação laboral diz respeito, justificada pelos resultados analíticos do trabalho durante a pandemia.
Analisada a pretensa alteração, percebemos que o Governo prioriza o combate ao recurso abusivo ao trabalho temporário, o combate ao falso trabalho independente, desincentivar o recurso ao trabalho não permanente, prevenir os riscos e abusos relativos ao trabalho experimental, o combate ao trabalho não declarado, a regulação das novas formas de trabalho, o reforço das relações coletivas de trabalho e da negociação coletiva, o reforço da proteção aos jovens trabalhadores-estudantes e estágios profissionais, a melhoria da conciliação entre a vida profissional, pessoal e familiar, a simplificação administrativa e reforço dos serviços públicos da administração do trabalho, e reforçar a regulação e transparência das empresas de trabalho temporário.
No cômputo geral prevalece a intenção do Governo proteger os trabalhadores e ampliar as garantias laborais que lhes são inerentes, o que nos parece de louvar. Somos da opinião que combater o recurso excessivo à contratação a termo certo infundada, é necessário. Combater os famigerados falsos recibos-verdes e o trabalho não declarado, é necessário. Regular as novas formas de trabalho, é necessário. Melhorar a conciliação da vida pessoal com a vida profissional, é necessário. Agilizar e promover a contratação coletiva, é necessário.
Contudo, parece-nos que este caminho que se vem fazendo no sentido de reforçar as garantias dos trabalhadores, é um caminho que não pode ser feito sem garantir que o empregador, o criador de emprego, o que desenvolve atividades e faz mover a economia, possa também conseguir ter a capacidade de gerir as vicissitudes da relação laboral. Não podemos querer que, aquele que tem sobre si maior responsabilidade, aquele que gera emprego, aquele que faz mover a economia nacional, tenha também uma responsabilidade, uma carga formal, e um acréscimo de limitações que consignam a sua atividade a um caminho estreito e limitador da adaptação às circunstâncias e às pessoas.
E é aqui que a evolução legislativa que se pretende instituir nos parece falhar redondamente. Parece existir um foco nas garantias do trabalhador e um amarrar da atuação do empregador no exercício dos seus poderes e da sua atividade. Este reforço dos direitos e garantias dos trabalhadores, aliado ao reforço da atividade fiscalizadora das autoridades públicas sobre o empregador, inverte, cada vez mais, o paradigma de que o empregador é a parte mais influente e poderosa na relação laboral. Aquilo que vem acontecendo traduz-se, não num equilíbrio de poder entre empregador e trabalhador, mas num desequilíbrio de poder que tende a sobrepor-se ao empregador, como consequência de um dogma claro de que os empregadores são potenciais maus empregadores, e os trabalhadores são sempre bons trabalhadores e potenciais vítimas. Ora, quem conhece a realidade laboral, sabe bem que assim não é.
Estamos em crer que a par destas medidas, deveriam ser promovidas medidas que aumentem a responsabilidade do trabalhador no exercício das suas funções, nomeadamente que responsabilizem o trabalhador pelo não cumprimento de formalidades tão simples quanto registar o seu horário de trabalho de forma diligente (formalismo altamente negligenciado pelos trabalhadores), agilizar o procedimento disciplinar quando a sanção que se pretenda aplicar seja a repreensão ou repreensão registada, e, tema sensível mas mais relevante, ampliar o espectro de formas de cessação dos contratos de trabalho, nomeadamente criando um sistema de despedimento sem justa causa. Acreditamos também que um aumento dos benefícios fiscais aplicáveis para os empregadores que cumpram com a defesa dos pilares que movem o governo, seria um interessante catalisador da empregabilidade.
Não queremos desenvolver em demasia estas propostas, mas queremos vincar que estas 70 alterações nada mais são do que uma sobrecarga nos empregadores. Empregadores sobrecarregados limitam o volume de empregos disponíveis e, sobretudo, condicionam o aparecimento de novos empregadores.
Ficamos com a ideia de que se trata, nada mais, nada menos, do que uma atuação pré-histórica onde cada rei queria deixar a sua marca e construía um palácio novo, uma estátua nova, uma compilação nova. Este governo quer deixar a sua marca, e quer fazê-lo da forma mais fácil: dar mais às massas votantes, sem ponderar as consequências e sem foco numa verdadeira e salutar evolução laboral.
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