BREXIT: ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO ENTRE A UNIÃO EUROPEIA E O REINO UNIDO

Por Rui Pedro P. Pinto e Joana Mendes Sampaio

O Acordo de Comércio Livre entre a União Europeia e o Reino Unido entrou em vigor no passado dia 1 de janeiro, sendo que, a partir dessa data, formalizou-se o afastamento deste do Mercado Único da UE e da União Aduaneira, o que significa, desde logo, o término da livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais. Consequentemente, a UE e o Reino Unido formarão dois mercados separados, com espaços regulatórios e jurídicos distintos.

Nesta senda, um tal acordo foi redigido tendo por base alguns pressupostos, nomeadamente, o respeito pela autonomia dos ordenamentos jurídicos vigentes e a clareza, transparência e eficiência das regras que irão regular o comércio e o investimento entre as partes, bem assim, a garantia de uma cooperação bilateral em questões de interesse comum.

Assim sendo, a circulação de pessoas, bens e serviços é, forçosamente, uma matéria elencada num tal documento regulatório da cooperação entre a UE e o Reino Unido, tendo, a livre circulação entre o Reino Unido e a União Europeia terminado e o Reino Unido implementado um sistema de imigração baseado em pontos (points-based immigration system) que prioriza habilidades e talentos sobre a origem de uma pessoa.

 

Comercio livre

Relativamente ao acordo de comércio livre, tendo o mesmo em vista a salvaguarda da indivisibilidade da liberdade de circulação de pessoas, bens, serviços e capitais e abrangendo, desde logo, o comércio de bens e serviços, saliente-se, aqueles que serão os domínios basilares de tal acordo: o investimento, a concorrência, os auxílios estatais, a transparência fiscal, os transportes aéreos e rodoviários, a energia e a sustentabilidade, as pescas, a proteção de dados e a coordenação em matéria de segurança social.

No tocante ao comércio, transportes e outros convénios relativos à liberdade de trânsito, fica definido que cada uma das partes, no seu território, permitirá uma livre circulação rodoviária pelas rotas mais convenientes para o trânsito em concreto, ou seja, tendo por base o local de origem e de destino. Por outro lado, as trocas comerciais passam a estar sujeitas a procedimentos aduaneiros e a controlos fronteiriços, à semelhança do que acontece com qualquer outro país terceiro e que não integre a UE.

Saliente-se ainda que o acordo prevê a continuidade e a sustentabilidade da conectividade aérea, rodoviária, ferroviária e marítima entre a UE e o Reino Unido, no entanto, de ora em diante as empresas de transporte de mercadorias deverão apresentar uma cópia certificada da licença comunitária para efetuarem operações de transporte entre estes territórios, o que, evidentemente, implica uma maior burocracia no acesso ao mercado, díspar do procedimento que o mercado único proporcionava.

No entanto, é estabelecida uma exceção para as empresas que possuam viaturas cujo peso bruto não exceda 3,5 toneladas, sendo que estas continuam autorizadas a efetuarem transportes para o Reino Unido, sem necessidade de licença comunitária, pelo menos até 20 de fevereiro de 2022.

 

Segurança Social e Vistos

Ao nível da Segurança Social e da atribuição de Vistos para visitas de curta duração, o acordo vem garantir um conjunto alargado de direitos aos cidadãos da UE e dos nacionais do Reino Unido a partir de 1 de janeiro de 2021, nomeadamente no que se refere aos cidadãos da UE que trabalham, viajam ou vivem no Reino Unido e aos nacionais do Reino Unido que trabalham, viajam ou vivem na EU. Destarte, neste domínio, para além de turistas, prevê-se a possibilidade de emissão de vistos para estadias até 90 dias, durante um período de seis meses, que passa a abranger viagens de negócios e deslocações profissionais, estabelecendo-se ainda a possibilidade de prorrogação do prazo de caducidade do documento até três anos. Contrariamente, as estadias de longa duração regem-se, integralmente, pelas regras e normas do ordenamento jurídico em questão.

Relativamente à concreta utilização dos mencionados documentos, os Britânicos veem-se obrigados a viajar com passaporte, com pelo menos seis meses de validade e emitido depois de 2011. Por outro lado, os cidadãos provenientes da EU, podem, até 30 de setembro de 2021, continuar a usar cartões de identidade europeus, como é exemplo o Cartão do Cidadão até 30 de setembro de 2021, sendo que, a partir de 1 de outubro de 2021, será necessário mostrar na fronteira um passaporte biométrico válido durante o período de estadia.

Evidencie-se ainda que em alguns países europeus os Britânicos vão ter de apresentar uma carta de condução internacional para poder conduzir, contrariamente às cartas de condução europeias que serão aceites no Reino Unido.

Já para viajar com animais de companhia, Britânicos e cidadãos da EU, passa a ser obrigatória a apresentação de um certificado de saúde animal e de vacinas.

No domínio da energia, é estabelecido um novo modelo para o comércio, com garantias de concorrência aberta e leal, incluindo normas de segurança para a exploração offshore e a produção de energias renováveis.

Por último, o documento estabelece ainda condições de concorrência equitativas, de modo a garantir uma concorrência aberta, leal e promotora de um desenvolvimento sustentável, onde as duas partes se comprometem a assegurar a condições de proteção do ambiente, dos direitos sociais e laborais, da transparência fiscal e dos auxílios estatais, de modo a que os direitos dos passageiros e dos trabalhadores, bem como a segurança dos transportes, não sejam prejudicados.

 

 

Trocas comerciais

No que diz respeito às trocas comerciais, nomeadamente a importação e exportação de bens e mercadorias, o Acordo traz algumas consequências para os operadores comunitários, que passam a estar sujeitos ao cumprimento das formalidades previstas na legislação aduaneira, entre as quais a apresentação de declarações aduaneiras de importação e de exportação. Nas importações, em particular, há obrigação de pagamento de direitos de importação.

Assim, em termos práticos, o Acordo, já identificado, terá impacto, principalmente, nas empresas que, efetivamente, realizam trocas comerciais com o Reino Unido, tais como a compra e venda de bens e serviços e a consequente movimentação de mercadorias. Isto significa que será necessário apresentar declarações alfandegárias na importação e na exportação quando o Reino Unido seja um dos países intervenientes.

Além da declaração, poderá ser necessário, ainda, fornecer dados de segurança e proteção, assim como uma licença especial para importar ou exportar determinados bens, nomeadamente, resíduos, certos produtos químicos perigosos e organismos geneticamente modificados.

Já no que concerne à importação/exportação de produtos com impostos especiais de consumo, como é o caso do álcool, tabaco ou combustível, será necessário cumprir formalidades adicionais. Mais, o Acordo prevê um conjunto de regras e procedimentos de IVA diferentes para transações com o Reino Unido e para transações dentro da UE e com a Irlanda do Norte.

Em Portugal, o Acordo já se encontra integrado na Pauta Integrada das Comunidades Europeias (TARIC) e já está disponível no Portal das Finanças –  SIGIP. Estas medidas podem ser consultadas na Pauta Aduaneira, aquando da consulta das medidas aplicáveis por código pautal, se na data da pesquisa for indicada uma data posterior ou igual à data de entrada em vigor do mesmo Acordo.

No quadro dos regimes preferenciais, entre os quais a exportação de produtos comunitários para países terceiros que celebraram Acordos de Comércio preferenciais com a UE e a importação de produtos de países preferenciais na EU, deverá consultar-se o documento “BREXIT – Consequências a nível da origem preferencial das mercadorias”, disponível no Portal da Finanças. Poderá ainda ser consultada informação no website oficial do Governo Britânico, recorrendo à ferramenta UK Global Tariff tool, que permite a pesquisa dos direitos aduaneiros por linha pautal.

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