Alteração ao Código da Estrada

Por Rui Pedro P. Pinto

O Código da Estrada e legislação complementar, por força da transposição da Diretiva (UE) 2020/612 para o ordenamento jurídico português, verá o seu texto alterado, num esforço de uniformização jurídica ao nível comunitário, com grande enfoque na promoção da segurança rodoviária, e respetiva redução da sinistralidade, mas, por outro lado, pretendendo uma maior desmaterialização e agilização do processo contraordenacional, muito em linha com o já conhecido SIMPLEX.

A grande novidade diz respeito à alteração do modelo de carta de condução que agora, com um novo grafismo e com a inclusão de código de barras bidimensional do tipo QR Code, passará também a abranger os veículos agrícolas, revogando-se assim a norma que previa anteriormente a mera exigência de uma “licença de condução” para a sua condução. Tal medida assentará na promoção da segurança rodoviária e a redução dos índices de sinistralidade, tendo sido estabelecidas regras especiais de segurança para os veículos em marcha lenta, designadamente tratores, máquinas agrícolas ou florestais e máquinas industriais, tais como a obrigatoriedade de instalação estrutura de proteção em caso de capotagem nos tratores ou máquinas agrícolas ou florestais, sob pena de coima num valor a fixar-se entre 120€ e 600€.

Nesta senda, várias foram as medidas de promoção da segurança rodoviária que vieram agravar as sanções anteriormente previstas. Em primeiro lugar, na sequência do grande número de sinistros rodoviários emergentes da utilização de aparelhos eletrónicos ou equiparados, tal como telemóveis ou outros aparelhos radiotelefónicos, é agravado o valor da coima a aplicar, fixando-se agora o mesmo entre os 250€ e os 1250€. Repare-se que, ainda a este nível, tal infração determina ainda a subtração de três pontos ao autor da infração. De seguida, em virtude do crescimento exponencial dos veículos equiparados a velocípedes, restringiu-se tal equiparação, para efeitos de circulação em pistas de velocípedes e em pistas mistas de velocípedes e peões, passando a ser autorizada a circulação nestas vias a veículos com uma potência máxima continua de 0,25 kW e que não atinjam mais de 25 km/h de velocidade. Por fim, o diploma destaca-se pela equiparação legal dos veículos automóveis descaracterizados de TVDE aos veículos de transporte coletivo, nomeadamente no que concerne às diversas agravantes que são impostas, como é exemplo a taxa de álcool no sangue permitida.

Ao nível das infrações previstas no código da estrada, será de destacar o aparecimento da proibição da pernoita e do aparcamento de autocaravanas fora dos locais expressamente autorizados para o efeito, prevendo a aplicação de coimas que se fixarão entre 60€ e 300€ ou o seu dobro se a pernoita ou aparcamento se verificar em áreas protegidas.

Relativamente aos documentos de que o condutor deve ser portador, o novo diploma vem agora prever a possibilidade de os documentos físicos serem substituídos por aplicação móvel que permita a comprovação dos dados referidos nos documentos e de carta de condução digital.

O prazo para apresentação dos documentos à autoridade indicada pelo agente de fiscalização é, no entanto, diminuído para 5 dias, bem como, a coima aplicável é agravada para um valor que se fixará entre 30€ a 60€.

A condução de veículo sem habilitação legal também sofre alterações, isto é, com o novo diploma vem-se determinar critérios subjetivos na determinação da coima, nomeadamente se o infrator é (ou não) detentor de carta de condução que habilite a condução da categoria concreta onde o veículo se insira. Assim, se anteriormente o valor era fixado, independentemente, de se encontrar o veículo se encontrar munido de algum tipo de título habilitador, com a nova redação do Código da Estrada, os valores da coima a aplicar alteram-se, nomeadamente:

  • Com coima de (euro) 120 a (euro) 600, se for apenas titular de carta de condução da categoria T;
  • Com coima de (euro) 700 a (euro) 3500, se for apenas titular de carta de condução da categoria AM ou A1;
  • Com coima de (euro) 500 a (euro) 2500, se for apenas titular de carta de condução de uma das categorias não previstas nas alíneas anteriores.

Ainda a este nível, o reconhecimento de títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro, deixa de depender do seu mútuo reconhecimento, passando agora a incidir sobre a reciprocidade das condições da sua emissão. Simultaneamente, a obtenção de carta de condução por via de troca por títulos de condução estrangeiros continua a ser possível, quando emitidos por outros Estados membros da União Europeia ou do espaço económico europeu; por Estado estrangeiro em conformidade Convenção Internacional de Genebra, de 19 de setembro de 1949, sobre circulação rodoviária, ou com o Convenção Internacional de Viena, de 8 de novembro de 1968, sobre circulação rodoviária; ou por último quando seja reconhecida idêntica validade aos títulos nacionais. Contudo, a troca está condicionada ao cumprimento de todos os requisitos legalmente fixados para a obtenção da carta de condução, dispensando-se apenas:

  1. A realização de provas do exame de condução para os títulos de condução emitidos por Estado-membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu;
  2. As provas do exame de condução para as categorias AM, A1, A2, B1, B e BE, e, de provas teórico-práticas, em regime de autopropositura, para as categorias A, C1, C1E, C, CE, D1, D1E, D, DE, T, dos títulos de condução emitidos no âmbito das duas Convenções anteriormente mencionadas;
  3. Realização de provas de exame, quando previstas em acordos bilaterais ou multilaterais que vinculem o Estado português.

Note-se, porém, que esta troca poderá estar condicionada a aprovação do requerente numa prova prática de condução quando tal não seja  requerida no prazo de dois anos, contados a partir da data da fixação da residência em Portugal ou após o termo do prazo fixado para a troca de título de condução vitalício emitido por estado-membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, bem assim, se existir registo de prova prática realizada em território nacional, em data posterior à da obtenção do título estrangeiro, com resultado de reprovado.

Também no âmbito da necessidade de realização de novos exames, o atropelamento e fuga passa a configurar um motivo justificativo para surgimento de dúvidas relativas à aptidão psicológica do condutor para exercer uma condução em segurança.

O catálogo de casos de caducidade dos títulos de condução, é ampliado, passando a consagrar-se a caducidade da carta de condução do cidadão que for condenado, por sentença judicial transitada em julgado ou decisão administrativa definitiva, pela prática de crime ligado ao exercício da condução, de uma contraordenação muito grave ou de segunda contraordenação grave. Concomitantemente, a renovação do título de condução deixa de ser uma possibilidade quando o titular reprove, pela segunda vez, em qualquer das provas do exame especial de condução a que for submetido ou tenham decorrido mais de dez anos sobre a data em que deveria ter sido renovado.

Por último, é de destacar a forma de prática dos próprios atos processuais pelas partes. No que toca à ANSR, esta, continuando a ser a entidade competente para o processamento das contraordenações rodoviárias, poderá agora notificar o infrator por via eletrónica. Paralelamente, os infratores poderão apresentar a defesa e demais atos através do recurso a suporte informático, com aposição de assinatura digital qualificada, nomeadamente através do Cartão de Cidadão e da Chave Móvel Digital.

A este nível será ainda de referenciar que o procedimento contraordenacional não se aplicará, como já anteriormente se encontrava previsto, a agentes das forças e serviços de segurança e órgãos de polícia criminal quando se demonstre fundamental para o exercício das suas funções, bem assim – e aqui encontramos a grande novidade do diploma nesta matéria – a condutores de veículos em missão urgente de prestação de socorro ou em serviço urgente de interesse público, devendo, nestes casos, a entidade com competência de direção, tutela ou superintendência juntar, no prazo de 15 dias úteis, a justificação e respetiva prova de que o condutor se encontrava a circular sob tais condições.

As novas regras entram em vigor no próximo dia 8 de janeiro de 2021.

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